22.5.11

Seção São Paulo em movimento - ENAPOL: "Todo mundo é louco, isto é, delirante" (J.Lacan)



"Psicose lacaniana"*
(Resenha desenvolvida na preparação para o V Encontro Americano - ENAPOL)


Por: Rodrigo Camargo EBP-SP – participante da Seção Clínica da CLIPP

                Há uma loucura da compreensão ao se compreender de fato o que é a loucura; a loucura da loucura de compreender. Em contrapartida, há a paixão de explicar e se comunicar com o louco. A loucura da comunicação e as relações sociais. A questão, segundo Jacques-Alain Miller, não seria mais “o que é um louco?”. Mas “como é que se pode não ser louco?”. Afinal, nos diz Miller, a velha questão sobre o que é um louco, o próprio Lacan respondeu uma vez numa apresentação de pacientes: é alguém perfeitamente normal. Pode até parecer estranho, mas não é. Não ser louco, com efeito, parece, aliás, muito menos natural do que sê-lo. O raciocínio é mais ou menos o seguinte: “a norma é social, o louco de um não é o louco do outro, o normal é louco e o louco, lógico” [1]

              Durante muito tempo, a leitura da concepção das psicoses em Lacan limitava-se a acentuar a foraclusão do nome-do-pai na estrutura, todavia a partir das estruturas que Freud extraiu das neuroses e do complexo de castração. Hoje, com Lacan, ou mesmo, Lacan contra Lacan, pode-se resumir essa trajetória como indo das relações de compreensão às relações simbólicas, seguindo assim a vertente do significante, para culminar no postulado, já numa outra vertente, a saber, a do objeto: e a de que todos os nossos discursos não passam de defesas contra o real [2]

              Não há, portanto, discurso que não seja do semblante. É por isso, inclusive, que o enquadre do objeto a é considerado semblante, e também uma elaboração simbólica do real. Porém, se Lacan pôde também afirmar que o louco é o homem livre, e os tipos clínicos em questão se encontram fora-do-discurso, é preciso compreender a sutileza desse outro tipo de enquadramento da realidade que se dá na psicose.

               Grosso modo, Lacan ao dizer que a psicose é a normalidade [3], na formulação de sua teoria, faz passar o nome-do-pai (alicerce da ordem simbólica) para os nomes-do-pai, no plural, isto é, que a psicose não é uma questão de déficit. 

             Finalmente, trata-se de restituir ao louco seu lugar de sujeito, que não está mais localizado no mesmo lugar que sempre lhe concedeu a psiquiatria ao classificar a doença mental segundo os pressupostos fenomenológicos. A psicose faz vacilar os semblantes [4], haja vista ela dizer algo de uma estrutura fundamental, ali mesmo onde tudo pode ser lido ao pé da letra, ou seja, um saber que não se sabe frágil, mas que provoca inquietações.

Referência

MILLER, J-A. “Lições sobre a apresentação de doentes”. In: Matemas I. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996.

[1] MILLER, J-A. “Lições sobre a apresentação de doentes”. In: Matemas I. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996, p. 138-149.
[2] _________. “Clínica irônica”. In: Matemas I. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996, p. 190-199.
[3] _________. “Suplemento topológico a “Uma questão preliminar...”. In: Matemas I. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996, p. 119-137.
[4] _________. “A invenção psicótica”. In: Opção Lacaniana, n. 36, Maio 2003, p. 15.

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