25.4.12

Clínica do Autismo - série AUTISMO


Desde o dia 16 de fevereiro foi colocada em linha A PETIÇÃO INTERNACIONAL PARA A ABORDAGEM CLÍNICA DO AUTISMO. Iniciativa do Instituto psicanalítico da criança - Universidade Popular Jacques-Lacan. Para assinar a Petição em linha acesse o site: http://www.lacanquotidien.fr

disponível em: Lacan Cotidiano 188


AUTISMO E PSICANÁLISE
«Só o comparem a ele mesmo»
Sonia Chiriaco

«Eu me levanto quando o sol se levanta, eu me deito quando o sol se deita»estas palavras parecem provir de uma voz robótica.«Está no Ursinho marrom», me diz a mãe de Yvan. «Ele não inventa frases», precisa o pai. O menino havia consentido na linguagem depois de sussurrar sua primeira palavra no ouvido da fonoaudióloga que o encaminhou a mim. Ele tinha 5 anos. Eu o recebi regularmente por 10 anos.
Nossas sessões se iniciavam por «mensagens» que Yvan me pedia para transcrever, longa sucessão de letras sem lógica aparente, que para minha grande surpresa, ele trazia de cor na sessão seguinte. Sua memória parecia infalível. As «mensagens» prosseguiram por muito tempo, passando de letras a números, aos órgãos do corpo como pedaços disparatados, depois aos planetas do sistema solar que o menino se punha a organizar. Com elas, apareceram as primeiras entonações.
Deixar-se levar pela linguagem implica um risco. Por vezes, ele se contorcia dolorosamente, tocando a garganta: «eu respiro um pouco, eu não estou morto»«eu não estou morto?»
Comer, dormir, encontrar o objeto anal, olhar, ouvir, tudo era fonte de angústia. Foi preciso tempo para Yvan domar suas funções corporais.
Ele aprendeu a ler e, na escola, se esquecia das graves dificuldades passadas. Se ele ainda deixava perplexos os professores quando se recusava obstinadamente a fazer um dever, era facilmente perdoado, porque se conhecia suas capacidades. Yvan atravessou, assim, todas as etapas da escola primária.
A tolerância diminuiu no colégio. Os pais, convocados sobretudo quando o menino recusava-se categoricamente a responder ao mandado do Outro, se esgotavam. Até então eles se apoiavam em seus progressos para suportar sua estranheza e as reflexões que ele não deixava de provocar..«Só o comparem a ele mesmo» eu lhes havia dito, para sustentar nosso trabalho. Eles se lembravam muito bem dos terríveis primeiros anos de Yvan:«sabemos que ele demora para aprender, mas hoje, nós não queremos que os professores o ensinem».
«Mensagens» insensatas em esboços de histórias, labirintos com circuitos sempre mais complexos, Yvan se põe a elaborar, com paixão, os planos para jogos de vídeo virtuais que ele testava com sua analista.
Na adolescência, ele entra pela primeira vez em contato com pessoas de sua idade, graças aos jogos em rede pela internet. Este semblante de vida social lhe convinha e, com a idade de 15 anos, decide espaçar nossas sessões, antes de interrompê-las.
Hoje, Yvan só vem me ver ocasionalmente, quando encontra um obstáculo que lhe parece insuperável. Em breve terá 18 anos. Ele não sabe se vai fazer as provas do ensino médio, porque não tem interesse nisto, detesta fazer uma cópia, não se projeta qualquer futuro, nenhum ofício, e detesta trabalhar. Ele se apaixona como nunca por jogos de vídeo cada vez mais complexos. Seus pais estão inquietos.
Comparado a si mesmo, Yvan percorreu um percurso formidável, mas ele continua incomparável a outros. É todo o problema de avaliação que se coloca aí.

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